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Das prioridades, influências e do idealismo incoerente



Em 03 de Julho de 2024, foi apreciado na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, CMADS, da Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 3468/2023, de autoria do Dep. Matheus Araújo Laiola, do União -PR.


A proposta foi relatada e apresentada para avaliação da CMADS, com pequenas e coerentes alterações sugeridas pelo Dep. Marcelo Queiroz, PP -RJ. Coerentes por sugerir mudanças no texto original, como a proposta de exigir documentação (criada a partir desta Lei, o Documento de Origem do Pescado- DOP, projeto antigo do Ibama), apenas da parcela industrial da atividade, em óbvio desvio ao princípio da isonomia, embora sobre uma incoerência original, a do Projeto de Lei em si e este “jabuti” de propor a criação do DOP, em matéria tão específica.

Basta ler a justificativa apresentada ao PL, e ela em seu primeiro parágrafo já entrega:

JUSTIFICAÇÃO

O caso recente1 da apreensão, pelo IBAMA, de quase 30 toneladas de barbatanas de tubarões (provenientes da morte de cerca de 10.000 espécimes), no litoral de Santa Catarina – mesmo havendo normativas federais proibindo a prática do finning (como a Instrução Normativa Interministerial MPA/MMA n° 14, de 26 de novembro de 2012) – renovou publicamente o debate sobre a necessidade de reforçar a repressão a essa prática cruel lesiva ao meio ambiente e à dignidade dos animais.

....”

 

A justificativa, referencia as apreensões e autuações midiáticas já consideradas por este Conepe em artigos anteriores, este o primeiro. Portanto, mesmo o que para esta entidade representativa dos interesses pesqueiros industriais pareceu, naquele momento, um “desserviço à Sociedade”, no que fomos acompanhados e subsidiados por outros entes e reportagens, mesmo assim, a ação acabou se transformando num PL e, nesta data, com alterações, teve parecer favorável em sua primeira Comissão de análise, a Comissão do Meio Ambiente de Desenvolvimento Sustentável. (Desenvolvimento de que? Não se sabe, pois pretende-se desvalorizar o fruto do trabalho e do recurso natural explotado!!)


Vale destacar, a colaboração citada na Justificativa do Prof. Dr. Vicente de Paula Ataíde Junior, com destacado currículo e uma dedicação especial às causas dos direitos dos animais. Nada contra, e parabéns ao Professor, que tem seus princípios e coerência, mas repetimos, somos totalmente favoráveis e já adeptos da proibição do finning, ele já não acontece no Brasil! 


As apreensões e todo espetáculo feito na ocasião foi sobre barbatanas extraídas em terra, obtidas de carcaças desembarcadas com elas ainda presas ao corpo, conforme normatizado. E aquelas extraídas do Cação Anequim, eram de capturas e desembarques desta espécies na mesma condição e prévios, sim prévios à vigência de proibição de  retenção a bordo, transporte e comércio da espécie,

 

( Errata: As Portarias 299 e 300/2022 foram revogadas pela Portaria MMA 354/2023, que sim manteve a espécie Anequim e quatro outras especies de tubarão ameaçadas, e portanto de uso restringido.)

Embora o Brasil tenha, pela ICCAT, uma pequena cota de 208 toneladas de Anequim, estamos proibidos de usá-la pelas normas nacionais... (Desenvolvimento!!).

 

Ufa, como é difícil sensibilizar a representação da Sociedade, o Congresso e os senhores parlamentares, a colocar de lado emoções, sensacionalismo e a intempestividade, para pensar pelo uso sustentável e pela valoração da Biomassa, da riqueza dos recursos e, portanto, no respeito à Natureza, à legalidade e nos benefícios socioeconômicos possíveis, quando alinhado à boa gestão.

 

Em outro momento, meio que forçadamente, achamos a oportunidade de expor, ainda na legislatura anterior, nesta mesma CMADS, em audiência pública convocada neste mesmo tema, aspectos sobre a pesca de elasmobrânquios oceânicos pela frota industrial e suas peculiaridades, nossa perspectiva e uma visão global do recurso, com bases científicas e com atendimento ao sistema de governança regional, a ICCAT, à qual o Brasil está conveniado. (disponível em: https://www.youtube.com/live/KiKDCEOKCUA?si=Yi8EeatEa7LaJxsk ) .

 

Mais tarde, e conforme sugerido em nossa apresentação na Audiência supracitada, já em novembro, foi apresentado durante a Reunião Anual da ICCAT, por seu Presidente do Comitê Permanente de Pesquisa e Estatística, SCRS, o resultado das Avalições de Estoque do Cação Azul, Prionace glauca. Estes resultados apontaram para a necessidade de limitar possíveis crescimentos nas capturas, propondo a estagnação, nos atuais níveis de mortalidade por pesca, destacando, entretanto, que na atual situação, o estoque Atlântico Sul, está sustentável. Ainda, propôs a alocação de cotas de capturas aos países membro, oferecendo ao Brasil a oportunidade de capturas de 3.481 t. desta espécie, tema apresentado neste artigo e na reportagem relacionada.


Também, o Projeto Tubarão Azul apresentou novas e importantes descobertas e aportes à melhor gestão deste estoque e ganhou extensão em tempo e abrangência, fruto da seriedade e responsabilidade com que tratou o tema. Lembrando que este Projeto nasceu como alternativa à situação criada por lei estadual que impossibilitava a descarga da espécie (transnacional!!) nos portos gaúchos, em detrimento exclusivo da sociedade pesqueira gaúcha.

 

A proibição do finning já existe, em norma infralegal, e é absorvida e conhecida pelos usuários, é obrigatório o desembarque das peças capturadas, com as nadadeiras anexadas, ou seja, que comprovadamente correspondam barbatanas com espécimens abatidos.

Nada contra tornar lei!


Mas seria muito mais efetivo promover uma revisão profunda da Lei da Pesca e de suas tantas inconsistências e subjetividades e incluir nela artigos que abordassem o tema do que, propor a alteração agora sugerida, com a inclusão e forçada de criação de um Documento de Origem do Pescado, originado no órgão de fiscalização, com ares óbvios de ordenamento, em mais um embaralhar de atribuições órgãos em promoção da insegurança e ambiguidades na difícil atividade pesqueira.


Há uma evidente influência do ambientalismo marketeiro, não se percebe um esforço de organização e adequação de gestão, apenas uma perseguição, instrumentos punitivos e em prejuízo aos atores envolvidos, principalmente pescadores, armadores e comerciantes, que tem nas barbatanas um importante valor agregado às capturas. Gente, são animais já abatidos, dos quais partes específicas têm mercado especial em outras culturas e mercados e são bem remuneradas, qual o sentido em proibir este comércio?? Sim há que regulamentá-lo, exigir máxima transparência e promover auditorias em suas movimentações, mas dentro do razoável, com seriedade e coerência e não, de forma alguma, da forma pirotécnica da apreensão que deu origem a este lamentável Projeto de Lei.


Temos infinitas maiores prioridades, temos um Programa de Rastreamento de Embarcações Pesqueiras completamente arcaico, falho, de baixíssima abrangência e, defende este Conepe, que opera de forma ilegal, com o envolvimento de atores não devidamente homologados e em desacordo com uma norma igualmente infralegal, de 2006, que tem trazido inúmeras sansões e sob o qual se baseia uma insana indústria de multas, digitais, sob o pretexto de ato tendente, num espetáculo diário de covardia e, de novo, procrastinação, do poder público, aliás dos poderes públicos, os 3 poderes!


Há o tema das interpretações criativas do conceito Fauna Acompanhante, onde autos de infração e multas são aplicadas, e passam a demandar esforço financeiro e tempo dedicado, com base num conceito de percentual da espécie acompanhante em descargas de embarcações, conceito este inexistente na norma vigente.


Há ainda várias inconsistências no que se refere a normas sanitárias, há timidez de esclarecimento, por exemplo, de que segundo a regra, só se poderia processar lagosta em sua forma inteira se proveniente de matéria prima recebida viva pelo estabelecimento processador. Com muita insistência, em sua última revisão o Manual de Fiscalização do Pescados já traz esta observação, mas o manual é um instrumento de consulta da fiscalização e não uma comunicação clara e direta com usuários, responsáveis técnicos de estabelecimentos processadores e atores da cadeia produtiva, a restrição ao processamento portanto, fica escondida, numa opacidade curiosa, aparentemente desinteressada, mas que traz reflexos importantes para a concorrência, a legalidade e a cultura da produção pesqueira.


Em outro caso, o teor de sal de produtos importados, ou mesmo nacionais, que tem exceções para algumas espécies, com processamento a bordo e com uso de água marinha no processo e não em outras, sob as mesmas condições de processo.


Finalmente casos de conferência de peso, onde variação de 1g, sim, 1g em 350g reportados na embalagem, geram autuações, multas e descrédito de processadores que trabalham com 500 t. mensais. E detalhe, a amostragem é feita em uma, uma das 6 embalagens coletadas para amostragem!

 

Por fim, considerar oportunidades em que Comissões conduzem temas sem um mergulhar ou análise mais aprofundada de riscos, benefícios e consequências que estas propostas realmente trazem a sociedade e à nação, mesmo quando a proposta apenas inibe o desenvolvimento e o benefício do cidadão e o reconhecimento de seu trabalho.

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