Há 42 anos este Coletivo Nacional da Pesca e Aquicultura – Conepe, tem o mandato formal de representar os interesses da pesca brasileira. Neste período, entre sucessos e fracassos, fomos criando calos na mão e na mente, engrossando a pele e a permeabilidade ao oportunismo e às ações sem a devida contextualização, formalidade e segurança. Entendemos que, como representantes, precisamos redobrar a atenção e nos posicionar com cautela e parcimônia.
Em agosto de 2022, por reuniões virtuais, entidades nacionais, estaduais e regionais ligadas a pesca, assinaram, em conjunto, uma Carta de Posicionamento, então chamada de documento resultante do Fórum Nacional de Aquicultura e Pesca – FNAP, que sim, embora virtual constitui-se de algumas reuniões em que as prioridades setoriais foram consolidadas e lapidadas neste documento, cuja proposta era ser entregue a todos os candidatos à Presidência da República ainda antes do primeiro turno das eleições do ano passado. O documento citava números setoriais, destacava a importância do setor de produção e indústria do pescado e elencava oito pontos de interesse principais. O primeiro, o mais significativo e cuja unanimidade foi o elemento agregador e origem da proposta conjunta, era: “Fortalecimento de órgão autônomo, vinculado ao MAPA, para gestão e fomento da Aquicultura e Pesca”. Outros, igualmente importantes, discorriam sobre: política de desenvolvimento; adequação do arcabouço legal; equidade tributária com outras proteínas; acesso a crédito e seguros; subvenção do óleo diesel pesqueiro; Programa Nacional de Rastreamento de Embarcações Pesqueiras; e, ainda, uma proposta de criação de um Código de Conduta para os Auditores Fiscais Agropecuários.
Não temos certeza, e nos penitenciamos por isto, se o documento foi efetivamente distribuído naquele momento e circunstâncias a todos os atores envolvidos. O que sabemos é o resultado do pleito em primeiro e segundo turno e, desde ontem, temos a certeza de que volta um Ministério da Pesca e Aquicultura – MPA. Sabemos, também, que este trabalhará os temas da pesca em conjunto, de forma COMPARTILHADA, com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima - MMAC, conforme decretos 11.349 e 11.352, que aprovam a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo de Cargos e Funções, respectivamente do MMAC e MPA, publicados na Edição do Diário Oficial da União de 1º de janeiro de 2023, assinados pelo Sr. Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva e os Ministros nomeados, pelo MMAC a Sra. Marina Silva e pelo MPA o Sr. André de Paula e Sra. Esther Dweck, esta nomeada como Ministra de Gestão e Inovação em Serviços Público. Estes são os fatos.
Portanto, o principal ponto elencado como interesse conjunto na Carta Setorial de 2022, que foi a manutenção da gestão pesqueira com autonomia e vinculação ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, não foi levado em consideração e, de forma absolutamente autêntica e merecedora de respeito, decidiu o Executivo empossado, pela reestruturação de um Ministério e de seu funcionamento vinculado ou “em articulação com o MMAC”.
Este Coletivo tem visto, recentemente, publicações circuladas na grande mídia e em meios de comunicação mais setoriais, indicando posicionamentos do Fórum Nacional da Aquicultura e Pesca – FNAP, em favor de indicações para Ministro A ou B e pelo agendamento de reunião de integrantes do FNAP com o atual Sr. Ministro. Mesmo não vendo nenhum problema nisto, cada instituição tem sua forma de se posicionar e submeter opiniões e posições, porém, como signatários do primeiro e original documento conjunto, veiculado como de autoria deste Fórum, o Conepe vem a público esclarecer sua independência e não coadjuvação com qualquer posicionamento posterior a Carta Setorial de agosto de 2022, feito em nome do Fórum Nacional da Aquicultura e Pesca – FNAP.
Entendemos ser um momento de instalação de Governo, e em especial ao Ministério da Pesca e Aquicultura - MPA, que se dará por uma instalação complexa de um Ministro de primeira viagem, considerada e respeitada por sua experiencia no Legislativo, que toma posse nesta tarde, dia 03 de janeiro, ainda na sede do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA. Até onde vai nosso conhecimento, ainda não temos o endereço certo do MPA e nem nomes conhecidos de composição de suas Secretarias e Departamentos, portanto, neste momento, entendemos que o mais adequado é ceder aos Ministros vinculados ao nosso setor e ao governo o espaço para arranjo interno. Existem assuntos, vieses e nomes que devem ser tratados como “de governo”, respeitado o interesse público e o mandato delegado pelo eleitorado aos eleitos e seus nomeados.
Estamos à disposição, abertos a conversa, temos nossos pleitos e entendemos sobre o melhor para nossa atividade, com a experiência de 42 anos. Mas destacamos nosso posicionamento sem atribulações ou atropelos, entendendo que é necessário calma para perceber o ambiente e experimentar o governo. O ambiente segue muito incerto e não será fácil ao executivo entender para onde conduzem os ventos, as correntes e tantas outras forças atuantes nesta complexa atividade.
O caminho já decidido (o fato) pelo retorno da gestão compartilhada é complicado, já o experimentamos e nos sentimos bastante à deriva, mas está decretado e acatado será. Encontraremos nosso ritmo e trabalharemos, como sempre, dando nosso melhor para nossa afiliação e lutando pelos interesses de nossas atividades, que repetimos, por caracterizar-se pelo extrativismo de recursos naturais precisa que ser conduzido com rigor, nos limites da sustentabilidade. Em seu tripé ambiental, social e econômico, entendemos que essa sustentabilidade deve tender sempre para uma maior ponderação ao ambiental, pois sem estoques pesqueiros e ecossistemas saudáveis e sem o melhor apoio possível na ciência e no conhecimento, respeitando o conhecimento tradicional e não acadêmico, não sobrarão recursos para atender e desenvolver o social e a sustentação econômica vinculada.
É este o nosso momento, temos nossas dúvidas, certezas e trabalhamos com fatos.
Desejamos aos recém-empossados do Executivo uma gestão de sucesso e transparência, desejamos ao Setor de Pescados desenvolvimento e segurança e a todos um ambiente colaborativo, sensato e tolerante. Nosso setor está bastante fragmentado, existem interesses e posturas distintas, existe uma componente artesanal, existe o lado mais industrial (longe de comparável ao que internacionalmente se entende por pesca industrial) e existem interesses nacionais e internacionais de produção, indústria e mercado. Temos gestão sobre a maioria dos recursos pesqueiros que utilizamos, mas repartimos a gestão de recursos internacionais sob controle de Organizações Regionais de Ordenamento Pesqueiro, como é o caso da ICCAT e da CAMELAR, e estamos num momento de negociações internacionais muito importantes como a do Acordo sobre a Biodiversidade em Áreas além das Jurisdições Nacionais – BBNJ, as espécies constantes nos anexos da CITES e a Convenção sobre a Diversidade Biológica - CDB. Existe uma estreita relação com o posicionamento internacional brasileiro e, portanto, com o Ministério de Relações Exteriores, e, por isso, precisamos de equipes e interlocução capazes de bem trabalhar estes temas tão peculiares em ambiente poliglota. Precisamos pensar também no ainda não superado imbróglio da restrição de exportação para o mercado europeu, derivada de dificuldades internas visto que não conseguimos estabelecer sintonia entre atribuições de produção e segurança sanitária e documental, algo muito importante, que precisa ser resolvido para voltarmos a um grande mercado, a ser reconquistado e mantido.
Sabemos que existem grandes desafios e precisaremos nos desapegar de vaidades e de prevalecimentos para que consigamos construir verdadeiramente e nos consolidar como importante atividade geradora de alimentos de alta qualidade nutricional, baixo impacto ambiental e grande potencial na aquicultura. O momento é de união e o Conepe continuará presente na luta pelo desenvolvimento sustentável da nossa atividade no Brasil e no mundo.
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