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SÃO AS BRONCAS DE MARÇO FECHANDO O VERÃO – 1/4

A corda sempre arrebenta do lado mais fraco. O caso da Lagosta CE

O mês de março tem apresentado situações complicadas para o setor pesqueiro, tanto produtores primários artesanais e industriais como processadores, comerciantes internos e exportadores têm experimentado circunstâncias de vergonha, desconfiança e de falta de credibilidade, derivadas, em sua ampla maioria, de realidade herdada de falta de governança e subjetividade normativa, generalizações, enfim, situações já conhecidas que deságuam agora em um endurecimento, sob certo ponto de vista desproporcional, de ações fiscalizatórias oportunistas e sensacionalistas.


Comecemos pela, assim chamada, Operação Macruros, que em 1º de março foi deflagrada no Ceará, com repercussão também em outros estados. Com base nas informações prestadas por exportadores, referentes à origem da produção exportada, o Ibama relacionou as embarcações relacionadas como fornecedoras e constatou a não correspondência de declarações de produção, seja por mapa de produção ou por mapa de bordo e, em alguns casos, ausência de rastreamento nas embarcações com esta obrigatoriedade.


A “Auditoria” concentrou-se nos dados de produção de 2017, os auditados continuaram produzindo, com seu Certificado de Registro e Autorização de Embarcação Pesqueira - RAEPs, ou Autorização de pesca revalidadas, entretanto, sem análise administrativa no decorrer dos anos de 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022. Em 2023, seguirão sob a mesma condição, segundo o ato normativo vigente, a Portaria n.º 547 de 17 de janeiro de 2022, alterada pela Portaria n.º 1.235 de 30 de agosto de 2022, ambas expedidas pela Secretaria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - SAP/MAPA (547 e 1235).


Esta situação vem se repetindo desde 2016, ano seguinte ao da extinção do Ministério da Pesca e Aquicultura, no Governo Dilma Roussef, momento em que as atribuições deste, ainda em regime de gestão compartilhada com o Ministério do Meio Ambiente - MMA, foram transferidas para o Ministério da Agricultura, então sob o comando da Sra. Kátia Abreu.


Toda estrutura ministerial, com 8 anos de funcionamento, foi abruptamente colocada como Secretaria dentro do MAPA, em movimento pouco estudado e restritivo, em muito, de equipes, sistemas e estrutura dentro deste novo e temporário espaço no MAPA.


Naquele momento se perderam registros, documentos e sistemas e, desde então, ainda restam consequências danosas aos autorizados e à governança da atividade. Não que fosse um funcionamento perfeito anterior, não, havia muitos problemas e descontroles, mas havia ao menos a emissão anual de autorizações de pesca renovadas e os documentos circulavam com a correspondência em data de emissão, validade e produção.


A partir dali, na pescaria de lagosta e tantas outras, Brasil afora, passaram a operar por prorrogações “automáticas”, desde que, estivesse em conformidade, autodeclarada, ao Programa Nacional de Rastreamento de Embarcações Pesqueiras por Satélite - PREPS, à apresentação de Mapas de Bordo, e comprovação do pagamento da taxa de requerimento de renovação da autorização de pesca.


Como uma bola de neve, o problema vai crescendo e tornando-se cada vez mais distante de solução.


Em janeiro de 2017, o Decreto n.º 8967, do presidente Michel Temer, alterou a validade das Autorizações de 1 para 3 anos, sem que as Superintendências Federais da Agricultura, Pecuária e Abastecimento na Unidade da Federação tenham necessariamente emitido novas Autorizações de Pesca com esta validade, especialmente no estado do Ceará.


Em 2019, a Pesca estruturada sob tutela exclusiva do MAPA, sem o compartilhamento com o MMA, depois de “passeios” pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços - MDIC e transformação em Secretaria Especial da Presidência da República, estabeleceu o Decreto n.º 10.170 do Presidente Jair Messias Bolsonaro, que alterou a validade das autorizações de pesca mais uma vez, agora para 5 anos. Novamente, sem que as Superintendências nas Unidades de Federação tenham realizado as devidas análises e atualizações das Autorizações de Pesca expedidas por meio do Sistema do Registro Geral da Atividade Pesqueira - SisRGP a esta realidade.


Tem-se, portanto, que o Ceará, maior produtor nacional e o estado com maior número de Autorizações para esta pescaria, trabalha, desde 2015, à base de renovações “automáticas”, autodeclarações, protocolos de requerimentos de renovações e taxas pagas à administração pública. Não houve neste período análise oficial dos processos remetidos à renovação.


Sob estas condições, de uma DESORDEM administrativa absurda, vê-se o IBAMA, na condição de amparado em mandados de busca e apreensão, invadir residências e escritórios de pessoas físicas e jurídicas atrás de documentos comprobatórios de rastreabilidade de produção de 5 anos pregressos!


Os envolvidos, são em sua maioria pescadores simples, de limitada capacidade de leitura e organização, inseridos em uma realidade cultural e comunitária restrita, a exemplo disto, podemos afirmar que é quase uma condição para negociação o dinheiro “vivo”, ninguém quer cheque ou transferência bancária por meios eletrônicos, esta gente não tem identidade fiscal. E o que geralmente ocorre é, ou as empresas se adaptam a esta realidade ou perdem capacidade de compra.


A passos lentos, isto está melhorando, as empresas atentas aos novos tempos estão achando caminhos de formalidade, mas é ainda um processo que, sem retaguarda e estrutura governamental, sem transparência de dados e ausência de engajamento, ainda está distante.


E a atitude e posicionamento truculento e intimidatório, remetendo a produções pretéritas, por parte do órgão fiscalizador, em nada colabora com um ambiente de construção, conscientização, participação e principalmente confiança, para podermos pensar em dias com efetiva governança da atividade, onde produtores terão ciência de regras, das concessões que lhe foram dadas, das condicionantes para manutenção deste privilégio, os intermediários sejam reconhecidos, os processadores tenham instrumentos de verificação da origem da produção que lhes é oferecida e que este conjunto de ações seja refletido no produto a ser comercializado e esteja acessível ao importador, atacadista, varejista, restaurante e consumidor, tudo sob controle e validação do Governo


O que não é aceitável é que, órgãos de um mesmo Governo fiquem apoiados em fragilidades e falhas administrativas de um ou de outro, ou ainda de terceiros, entes do Executivo Nacional, apontando para os usuários a responsabilidade e o vexame de toda esta situação de descontrole desta atividade.


No dia 2 de março, como Coletivo Nacional de Pesca e Aquicultura, fomos gentilmente recebidos pelo Sr. Ministro André de Paula e, em conversa abrangente e franca, passando por vários pontos e prioridades ao nível nacional e, num segundo momento, com as especificidades regionais e setoriais de nossos associados.

Destacamos a incongruência de esta situação e o desrespeito do Executivo com o cidadão, trabalhadores, gente honesta!


É preciso encontrar um caminho de ajuste, com a conivência de órgãos de controle e fiscalização, assim traçarmos um Plano de Readequação de registros e controles da atividade pesqueira, o tecido sobre o qual se costuram remendos, disfarces e postergações já está arruinado e não se sustenta, prevalece a insegurança e o descrédito e, neste lamentável episódio que assistimos, humilham-se e expõem-se pessoas, empresas e reputações de forma desproporcional e insensata.

Esperamos que a lucidez, capacidade de ouvir, o relacionamento, força e entrosamento político-parlamentar que o Sr. Ministro construiu ao longo de sua carreira possam sensibilizar a todos e que possamos passar pelo necessário “reset”, cancelamento, chamamento de interessados, estabelecimento de condições e retomada da atividade pesqueira dentro de registros precisos e de fácil acesso e legitimação.

Foto: Redes Sociais André de Paula


Como exemplo citamos sempre os DETRANs, onde informações básicas são acessíveis só com a Placa do automóvel e maiores detalhes, ausência de sanções, licenciamento, etc., estão protegidas para interesse e uso exclusivo do usuário responsável.

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